Bem vindo(a) hoje a mais um episódio do podcast oficial da Tribo Forte!
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Neste episódio:
- Vamos falar sobre como realmente funciona a criação de gado no Brasil;
- Participação especial da zootecnista Anna Flavia;
Escute e passe adiante!!
Saúde é importante!
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Transcrição do Episódio
Rodrigo Polesso: Olá pra você, bem vindo a mais um podcast aqui da Tribo Forte! Seu podcast semanal de saúde baseado em evidência. E hoje é um podcast extremamente especial, extremamente especial. A gente vai falar hoje sobre gado, sobre carne, sobre pecuária no Brasil. E temos aqui uma pessoa bastante especial, extremamente capacitada pra falar desse assunto, que faz tempo que eu e o Dr. Souto queremos na verdade cobrir, por causa do tamanho da bola de balelas que é dita por aí na mídia. Quantos mitos, quantas informações erradas, tendenciosas, políticas, que são compartilhadas por aí na mídia, tentando formar a opinião no pessoal. Então porque não conhecer um pouco mais de quem sabe o que ta falando, que pode trazer alguns fatos pra gente poder analisar com uma mente mais cética sobre esse assunto, do gado, da criação de gado no Brasil, todos problemas que isso pode ocorrer ou não. Hoje que está aqui comigo é o Dr. Souto, como sempre, Dr. Souto tudo bem?
Dr. Souto: Tudo bem Rodrigo! Boa tarde!
Rodrigo: Boa tarde! E também temos aqui a participação da zootecnista Anna Flavia. Anna Flavia é zootecnista de formação, tem também um mestrado em zootecnia, tem um doutorado em zootecnia, e se não bastasse ela tá fazendo pós doutorado também na UNB. E Anna Flavia, ela é também, pelo que eu sei, me corrige já em seguida, ela é filha, geração, mais de uma geração de pessoas que tão na terra, fazendo acontecer nesse Brasil, então ela pode contar um pouco mais sobre isso também. Então eu te dou as boas vindas aqui Anna Flavia, nesse nosso podcast Tribo Forte. E eu espero que essa conversa seja bacana pra todo mundo e possa elucidar muita coisas que tão nebulosas sobre esses assuntos todos. Então bem vinda a esse podcast, tudo bem?!
Anna Flavia: Boa tarde! Muito obrigada pelo convite! Me senti lisonjeada! Faz tempo que to querendo retribuir, afinal de conta foram vocês que transformaram minha vida, me ensinaram a comer comida de verdade e agora eu to aqui pra retribuir.
Rodrigo Polesso: Ah, que legal! Lembro que a gente vinha conversando Dr. Souto, a Anna Flavia sabe muito o que está falando, e aponta firme. Anna Flavia, qual que é… bem, além da sua enorme lista de graduações, você é filha de pecuaristas, fazendeiros?!! Como que é?
Anna Flavia: É o seguinte, minha família é do interior de Minas, os meus pais nasceram em área rural. Os meus avós eram pecuaristas, minha avó era apaixonada pelas búfalas que ela criava. Minha mãe cresceu dentro de curral. Só que o meu pai teve contato com avicultura durante a adolescência dele, e depois de muitos anos de trabalho em cidade e tal, meu pai resolveu se tornar avicultor. Então eu cresci dentro de granja, a gente trabalha com avicultura de postura comercial, que seria os ovos que a gente come. Porque a avicultura é dividida em 3 ramos, os ovos galados, que dão origem aos pintinhos de frango de corte, os galados que dão origem as poedeiras, e as poedeiras comerciais, que são os ovos que a gente come do mercado. Então o meu pai produz ovo comercial. Então eu cresci dentro de granja com ele, mas na nossa fazenda a gente tem gado, a gente tem ovelha. Só que o nosso gado é para consumo próprio, consumo dos funcionários. Mas eu sempre fui apaixonada por ruminantes, na minha graduação eu sempre trabalhei com genética de ruminantes, no meu mestrado eu fui pra São Paulo, eu continuei na área de ruminantes, no doutorado continuei na área de ruminantes. Sempre trabalhei… eu sempre gostei mais de ruminantes, o meu pai é que é tão apaixonado por galinha. Eu gosto das galinhas também, mas os ruminantes são especiais. E agora, no pós doutorado, eu trabalho com animal silvestre, com aves, mas isso não… eu continuo gostando dos ruminantes da mesma maneira. Num futuro próprio eu pretendo trabalhar com ruminantes.
Dr. Souto: Ou seja, como os nossos ouvintes estão sabendo agora, a doutora Anna Flavia fala sobre o assunto não apenas baseada em teoria, mas ela vive isso durante toda a sua vida.
Rodrigo Polesso: É, isso é bacana! A gente dividiu o podcast em dois, pelo menos que a gente vai fazer, o tópico desse em particular é como funciona a pecuária no Brasil. Vamos colocar o ponto nos “is” né pessoal. Saber como é que funciona de fato a pecuária, a criação de gado no Brasil, mitos e fatos. Pra gente poder conversar a respeito de fatos, não mais de tanta ideologia e de disse e não disse por aí…
Dr. Souto: É, porque… deixa eu interromper… muitos de nossos ouvintes recebem o tempo todo, pelas redes sociais, ou amigos seus enviam, esses documentários que circulam por aí, que tem no Youtube, que tem no Netflix, que são documentários que são documentários de propaganda, e se baseiam muito no modelo norte-americano. Então a gente achou que era muito importante que as pessoas, a maioria que moram na cidade, que nunca tiveram contato com campo, saibam a realidade de como é que funciona a pecuária no Brasil.
Rodrigo Polesso: Exato, exatamente! Então isso a gente pode convidar a Anna Flava pra falar, principalmente se a gente pode extrapolar tudo isso, todas essas imagens, todas essas coisas que eles falam nesse documentário do Netflix, que basicamente é como é feita a criação de gado nos Estados Unidos, se a gente pode traçar um paralelo direto e assumir que é a mesma coisa no Brasil… se você pudesse explicar um pouquinho como funciona a pecuária no Brasil e qual essa diferença então entre como é feito isso aqui e como é feito em outras parte do mundo, como Estados Unidos, por favor.
Anna Flavia: Com certeza! Eu acho que é interessante… eu vou fazer com vocês uma construção de pensamentos, assim como vocês fizeram comigo uma construção de pensamento em relação aos alimentos. Não vamos dividir em pecuária dos Estados Unidos e do Brasil. Vamos dividir o mundo em duas zonas, zonas temperadas e zonas tropicais. Imaginem só, as zonas temperadas, lógico, os Estados Unidos, os países desenvolvidos, com exceção de Austrália e de outros, mas a maioria dos países desenvolvidos estão em zonas temperadas que são umas zonas de menor biodiversidades, por consequência dessa menor biodiversidade tem menos parasitas, tem menos pragas, tem menos predadores. Então essa parte facilita pra pecuária deles. Por outro lado, zonas temperadas tem as diversidades climáticas, eles passam parte do tempo com a temperatura muito baixa, parte do ano também em neve. E aí a gente pega e lembra lá da escola, o que as plantas precisam pra crescer? Temperatura, luminosidade, nutrientes e água. Então se você tem uma diversidade climática pensando em baixa temperatura, você tem um menor crescimento de plantas, você tem uma maior necessidade de arrazoamento de animais, ou seja, de fornecer comida a esses animais, uma vez que parte do ano as plantas não vão ter um crescimento adequado, por conta do período de inverno. Só que a natureza é perfeita, você pensa “poxa, como é que Deus ia fazer”, Deus ou qualquer outro ser que as pessoas acreditam, “ia fazer um mundo onde parte dele faltam nutrientes para os animais?”. Não, não falta, nas zonas temperadas as plantas são mais nutritivas, são plantas de menor atividade metabólica. São plantas que tem os caules, os colmos, menores, ou seja, são plantas com menos lignina, menos celulose, a parte estrutural da planta, grosseira, dura da planta, essas plantas das zonas temperadas tem menos. Os animais dessas zonas temperadas são os animais selecionados a muito tempo pra produção animal. Nessas zonas temperadas os países são desenvolvidos, então você tem um maior uso de tecnologia, se a gente for pensar em tecnologia de tratores, maquinários de uma forma geral utilizados no campo, e nesses países você tem subsídios governamentais. Produtor rural dos Estados Unidos, por exemplo, da Suécia, da França, eles recebem um incentivo do governo, porque tem um maior êxito rural. Um jovem nos Estados Unidos, que ta se formando no ensino médio, ele não quer saber de ficar na fazenda com o pai, ele quer ir pra cidade, ele quer mexer com administração, com direito, com tecnologia né?!! Então o governo dá esse subsídio pras pessoas continuarem no campo. Então você tem essas características das zonas temperadas. Já nas zonas tropicais, o que acontece, as zonas tropicais, o próprio nome já diz, abaixo dos trópicos, você tem a maior biodiversidade do mundo. Biodiversidade tanto de plantas, quanto de animais. Por conseguinte você tem mais predadores… a gente vai falar dessa questão dos predadores mais tarde, que é muito importante no Brasil, mais pragas, endo e ectoparasitas. A gente brinca né, que o Brasil é abençoado por Deus e cheio de pragas. Então a pecuária e a agricultura no Brasil é muito mais difícil de ser controlada por conta disso. Então em zonas tropicais, não só no Brasil, você tem uma maior necessidade, um maior uso de inseticidas, de herbicidas, de medicamentos veterinários. Só que o clima tropical, como a gente tinha falado das plantas lá do segundo grau, ele também é favorável, você tem maior quantidade e intensidade luminosa, maior temperatura, água… você tem todas as condições pra você ter pastagens, áreas de pastagens, e por isso nas regiões tropicais não faz sentido você não ter criação de animais soltos. Os países de clima tropical, a grande maioria, a grande maioria mesmo, os animais são soltos, a pecuária é a pasto. Não tem como você refutar esse argumento, faz parte do clima tropical. E no clima tropical os animais são mais seletivos. Por que são mais seletivos? Você tem uma maior diversidade de plantas, então eles tem maior pode escolha, que planta que ele vai comer. Ele tem maior número de plantas que estão em crescimento, plantas mais suculentas. Então ele pode, só que são animais menos produtivos, a gente vai explica isso mais tarde, são animais mais bravios, mais adaptados ao clima quente e restrições alimentares. Imagine só vocês, Índia é o berço dos animais domésticos. Os animais que a gente tem pra produção de alimentos vieram, quase todos, ali da região da Índia, Oriente Médio, China, são todos ali daquela região. Então assim, é uma região com muitos predadores, então os animais daquele local precisam parir com facilidade pra poder fugir daquele ambiente o mais rápido possível. Precisam ter uma habilidade materna. Porque se o predador vier vem pegar o filhote e ele não tiver nem aí pro filhote, o filhote morre, a espécie não continua. São animais com características anatômicas, adaptadas ao clima quente, e, como eu falei, nas zonas tropicais as plantas, diferentes das zonas temperadas, são menos nutritivas. Então você tem uma maior restrição alimenta, você tem mais diversidade, você tem mais poder de escolha, mas você tem plantas de menor valor nutricional.
Dr. Souto: Anna Flavia, então só pra reforçar, para as pessoas que estão vendo documentários na televisão, vendo aquele gado todo confinado num chão de concreto, que não consegue nem se mexer. Isso não é a realidade da criação de gado no Brasil?
Anna Flavia: Absolutamente não.
Dr. Souto: Pessoal, quando vocês viajam pelas estradas e vocês veem de um lado e de outro da estrada o gado pastando no pasto, aquilo não é uma exceção, aquilo é a maioria do gado brasileiro, ele é alimentado na maior parte da sua vida a pasto, correto?
Rodrigo Polesso: Você tem um número pra isso Anna Flavia? Qual a porcentagem do gado brasileiro que é criado a pasto?
Anna Flavia: É o seguinte, nos países de clima temperado, você tem a possibilidade, existem ruminantes que a partir do momento que nascem, já são confinados e passam a vida inteira confinados. No Brasil não, no Brasil todos os nossos animais são criados até a puberdade, ou seja, até o período reprodutivo a pasto. E a outra parte, por exemplo, 12% do nosso gado, passa os últimos 3 meses, ou os últimos 120 dias, no caso das fêmeas, em regime de confinamento, pra parte de engorda.
Rodrigo Polesso: Por que 12% só?
Anna Flavia: É o censo agropecuário. 12% dos animais que foram abatidos no Brasil, o último cens tá? Da Associação Brasileira dos Importadores de Carne. Esse censo é do IBGE tá? O Ministério da agricultura, pecuária e abastecimento, ibge e outras instituições fazem essa coleta de dados, e a ABIEC, que é a associação Brasileira de Importação de Carne, eles compilam num sumário que é publicado anualmente. Então, no último censo, 12% do nosso gado abatido no Brasil veio de engorda no confinamento.
Rodrigo Polesso: Eu só queria entender porque somente 12% do gado tem essa engorda final. É por causa de uma carne, como carne gormet, alguma coisa especial? Por que os outros, a outra maioria não faz isso?
Anna Flavia: Vamos continuar, antes de falar do confinamento eu preciso falar pra vocês dos sistemas. Então, a gente falou de, zonas temperadas e zonas tropicais. Agora, focando na pecuária, isso no Brasil inteiro, você tem sistema extensivo, semi-intensivo e intensivo. O sistema extensivo, no Brasil, por exemplo, ele é caracterizado por fazendas grandes, latifúndios muito grandes mesmo. Onde os animais ficam no pasto a vida toda, não tem controle… é tipo assim, o gado tá lá no pasto, o produtor não tá preocupado, não tá dando a mínima. Entendeu?
Dr. Souto: Se cria sozinho…
Anna Flavia: É, é quase isso… ele se cria sozinho, é tipo isso. As vezes ele pode ir no curral pra receber uma vacinação, mas ele quase que se cria sozinho. Aí a medida que você vai intensificando a produção, que você vai colocando um pouco de tecnologia, fazendo maneiras de pastagens, dando uma nutrição diferenciada. Aí vai mudando de semi-extensivo pra intensivo. O intensivo seria um manejo, pode ser animal a pasto ou pode ser o animal confinado, mas seria o uso de diversas tecnologias, tanto a nível sanitário, nutricional, reprodutivo… sistema intensivo é um investimento financeiro muito grande do produtor. Ainda assim a gente ainda precisa dividir em 3 fases, a pecuária ela se divide em cria, recria e engorda. Tem gente que cria gado só pra vender bezerro. A pessoa tem lá o touro, a vaca… nasce, quando desmama, de 6 a 8 meses, o produtor vende aquele bezerro, ou bezerra, tanto faz. Ele vende pra quem vai fazer a recria, que é a desmama até a puberdade… quem recria vende…
Dr. Souto: E Anna Flavia, a recria normalmente é feita a pasto no Brasil?
Anna Flavia: Sim, cria e recria é sempre a pasto. Gado de corte é sempre a pasto.
Dr. Souto: Tá pessoal, vocês que tão nos escutando, que assistem documentários estrangeiros, no Brasil carne é criada a pasto.
Rodrigo Polesso: Que é uma exceção aqui no norte. Porque aqui você paga bem mais caro pra ter gado criado a pasto. E 100% a pasto é mais raro ainda, e até impossível em meio período do ano. Então, por exemplo aqui no Canadá, você tem gado criado a pasto 100%, mas eu falei com os açougueiros, eles importam na outra metade do ano gado da Nova Zelândia, que daí eles podem inverter o polo, a estação, e ainda oferecer 100% a pasto o ano inteiro. Coisa que a gente tem aí no Brasil o ano inteiro muito facilmente.
Dr. Souto: Isso, o problema é que no Brasil pessoal se baseia nos autores estrangeiros, e passam a ter uma discussão que não nos pertence Anna Flavia, que é assim; “nossa, como é que eu vou saber se a carne que eu vou comprar no supermercado é uma carne criada a pasto?”. Você sabe porque você ta no Brasil. Por isso você sabe que foi criada a pasto.
Anna Flavia: Olha, vocês podem, a gente pode resumir num valor, gado no Brasil ele passa no mínimo 14 meses da vida dele no pasto tá? 14 meses no pasto. Então assim, e tem a fase de engorda, ou de terminação, é a fase mais curta, digamos assim. E tem pecuarista que faz o que a gente chama de ciclo completo, que é a cria, a recria e a engorda. Então ele tem animais de diferentes idades na fazenda dele, e ele vende animais de diferentes idades. Ele vende bezerro, ele vende garrote, que é o animal, o adolescente, ou a novilha. E ele vende o animal já acabado pro frigorífico.
Rodrigo Polesso: Você mencionou que 88% do gado seria criado a pasto, ou melhor, 12% recebe essa engorda mais rápida. Isso significa que 88% do gado ele come durante todo o ciclo da vida dele grama, ele não passa pra essa engorda final? Assim, tirando suplementos e coisa menores no caso…
Anna Flavia: Aham, sim!
Rodrigo Polesso: É isso mesmo? Boa notícia hein!
Anna Flavia: 88% do nosso gado é a pasto. Tem um sistema que a gente chama de semi-confinamento. Mas o simi-confinamento é assim, o gado tá lá no pasto, tem os piquetes lá, normal. Só que tem umas áreas em que o produtor coloca o cocho, que é a parte lá onde ele vai colocar o suplemento. E aí varia… por que existe esse sistema de semi-confinamento, e por que mesmo num sistema 100% a pasto os animais ainda assim recebem, nem que seja um sal mineral? As nossas pastagens elas sofrem uma flutuação nutricional muito grande, justamente porque estão em clima tropical. Principalmente fósforo, os capins perdem nitrogênio e fósforo. Então na época seca… outra coisa, a pecuária ela tem várias divisões, a gente fala da época das águas e época das secas. No Brasil a gente tem o que? Verões chuvosos e inverno seco. Então quando você ta falando das secas você ta falando do início do ano, tipo maio, junho, julho… não tem chuva e ta frio. Agora, no nosso verão, por exemplo, novembro, dezembro, janeiro, que é a estação reprodutiva, você tem chuvas, você tem altas temperaturas e você tem um crescimento maior das plantas.
Dr. Souto: Anna Flavia, olha só, nesse 12% do gado, que faz a terminação, com… que recebe a suplementação. Eu acho que a maioria das pessoas imagina que o gado fica confinado num lugar onde ele não pode se mexer, porque elas viram isso no Netlfix, e comem exclusivamente grãos. Não é bem assim né? Explica pra nós aí…
Anna Flavia: Tá, vou explicar como que funciona terminação no confinamento. Primeira coisa, por que faz terminação no confinamento? A terminação em confinamento ela proporciona a engorda de animais mais rápido, o abate dos animais numa idade mais jovem. O que isso quer dizer? Carne macia. Quanto mais velho o animal pior a carne. O confinamento você tem um maior controle da composição nutricional da dieta, da qualidade daquela dieta. E no confinamento você pode aproveitar a genética daquele gado. Se você em um gado que, por exemplo, que oriundo de zonas temperadas, a gente tinha falado das diferenças, de taurinos e zebuínos, você tem gado com genética de ganho de peso, se ele ficasse só no pasto, você taria subutilizando aquela genética, entendeu como é que é? Só que a gente sabe que a carne oriunda de confinamento, embora ela seja mais macia, ela é uma carne com menor quantidade de ômega3, porque o ômega 3 vem do capim. Então assim, o confinamento é basicamente pra antecipar o período de abate. Quanto mais cedo o produtor puder vender aquele gado e retirar aquele gado da propriedade melhor né?! Menor o custo pra ele. E pra nós… ah, e padronização, por exemplo, você vai num supermercado, imagina se cada vez que você fosse no supermercado a carne lá que você gosta, vamos supor que você seja apaixonado, sei lá, por picanha, cada vez que você fosse ao mercado a picanha tivesse de um tamanho, tivesse com uma quantidade de gordura diferente. Então o confinamento traz essa padronização do produto, ele tem vantagens e desvantagens ao consumidor. Só que é o seguinte, o animal confinado, a área de confinamento ela pode ser feita de terra batida, pode ser de pastagem mesmo, geralmente é de terra. E o que acontece? Você tem vários tipos de alimentos, você tem… a gente vai explicar mais tarde sobre a questão da silagem, que é o capim fermentado, você tem os fenos, que é o capim desidratado. A gente não tem fruta desidratada né? O pessoal não gosta de fruta desidratada? Então o feno é o capim desidratado, você tem recurso das capineiras, que são capins que você corta ali na hora e oferece pro gado. E você tem utilização de grãos. Assim como você também tem utilização de subprodutos da indústria, por exemplo, São Paulo é o estado de maior produção de laranja do país. O bagaço da laranja é utilizado nos confinamentos. Resíduos de cervejaria, por exemplo, Paraná e outros estados que tem indústria, também são utilizados no gado. Então no confinamento você tem utilização de produtos que a indústria ia jogar fora.
Dr. Souto: Anna Flavia, isso é muito importante, então vamo salientar pra quem está nos ouvindo, porque o pessoal ta muito ligado, e com razão, na questão ecológica. Então o uso do gado nesse período do confinamento, é uma forma de destinar pra consumo humano, produzindo proteína de alta qualidade, coisas que seriam jogadas no lixo e iriam poluir a natureza. Ta certo?! Resíduos da então, como você disse, da produção do suco de laranja, então aquele resíduo, aquele bagaço, ao invés de ir fora apodrece na natureza vai gerar carne de boa qualidade…
Anna Flavia: Só fazendo uma comparação aqui, a Embrapa ta estudando, a gente recebeu a notícia, a Embrapa está estudando pra ajudar os agricultores de caju aí, pra aproveitar o bagaço de caju e fazer hambúrguer, mas na boa, é muito melhor o hambúrguer de carne, né, tipo, nutricionalmente falando…
Dr. Souto: Claro… dá bagaço de caju pro gado que ele faz o resto.
Anna Flavia: É melhor que dá o bagaço pra gente, hehe…
Rodrigo Polesso: Exatamente, hambúrguer é só de carne…
Dr. Souto: Então existe até uma expressão em inglês, eu não sei qual é a tradução, que chama upcycling, que significa então pegar coisas de pior qualidade nutricional, como esses bagaços, esses restos, e o gado consegue através de sua mágica de ruminante, que você vai explicar daqui a pouco pra nós, transformar isso que pra nós não tem valor nenhum, e iria virar lixo na natureza, transformar isso em alimento da melhor qualidade pra consumo humano. E outra coisa pra chamar a atenção das pessoas que veem documentários, é que parte desse engorde é feito… aliás, a maior parte pelo que eu entendi, você me corrige, não é só com grãos, a maior parte é com celulose dessas diversas fontes, de silagem, de forragem, desses bagaços… e sim, tem um pouco de grãos.
Anna Flavia: Sim, uma outra coisa que eu queria salientar, as pessoas fazem muita confusão com a palavra ração, nenhum alimento oferecido pro gado se compara com a ração de cão e gato que você vai no supermercado e compra. Pra começar, que toda alimentação, toda dieta proporcionada pro gado é feita diariamente. Numa fazenda, mesmo se você bate ração, porque tem fazendas que tem fábrica de ração, uma parte das fazendas tem, mesmo que você bata uma ração ali, é diário, não é uma ração de gôndola de supermercado, que fica meses ali, entendeu? É um alimento fresco, oferecido pro animal na hora.
Dr. Souto: Perfeito! Então para as pessoas entenderem, não fiquem imaginando bolinhas coloridas, como é a ração do pet que você tem em casa. Quando ela está falando ração pode ser feno, pode ser capim por exemplo, colocado num cocho. Eu to salientando essas coisas Anna Flavia, porque assim, você vive essa realidade todos os dias, mas a maioria das pessoas que ta sendo influenciadas pela mídia e por esses documentários, são pessoas urbanas que nunca botaram uma bota e pisaram na lama numa fazenda, nunca… as pessoas não tem ideia.
Rodrigo Polesso: Siga Anna Flavia… depois desse confinamento, enfim, como a gente falou, você quer falar um pouco talvez dessas duas raças, digamos assim, desses bois, a diferença… você falou do potencial genético, esse tipo de coisa, como difere de uma zona pra outra…
Anna Flavia: Ah ta, vamo lá! A gente tem, em relação a genética animal, a gente tem duas divisões, animais taurinos e animais zebuínos. A origem do gado, ela ainda não é 100% compreendida, mas a gente sabe que os zebuínos se originaram ali na regia da Índia, como falei pra vocês, são indu-Paquistaneses, a grande maioria das raças. E os taurinos, eles se espalharam ali do Oriente Médio, parte foi pra Europa e parte foi pra África. A África também tem zebuínos, mas em climas temperados, por exemplo, você só encontra taurinos. No Brasil a gente não tinha gado, a gente recebeu os animais domésticos com a colonização dos portugueses. No Brasil a gente não tinha, nenhum do tipo do gênero bos. A gente tinha outros mamíferos. Então assim, os taurinos são selecionados a mais tempo, e em melhoramento genético a gente fala o seguinte; quanto mais selecionado, mais produtivo é um animal, mais ele produz leite, mais ele engorda, menos resistente as doenças ele fica. Porque essa interação entre os genes acaba atrapalhando a questão imunológica. Então os animais taurinos, lembra que eu falei pra vocês, nas regiões temperadas tem menos predadores. Então os taurinos eles são animais mais mansos, os chifres são menores, eles não tiveram, na evolução deles, eles não tiveram que combater predadores, eles tinham pouquíssimos predadores. Então eles evoluíram basicamente só pra comer ali a pastagem deles tranquilamente. Só que devido ao manejo do gado, com o tempo, eles se tornaram poucos selecionadores, até porque eles nunca tiveram tanta biodiversidade de plantas assim. Eles são considerados consumidores de gramíneas mais frescas, os taurinos tem a maior capacidade digestiva, o que isso quer dizer? Eles tem o metabolismo mais acelerado, eles tem uma capacidade, um volume de capim que eles conseguem comer mais, eles nunca precisaram de andar muito. Eles tem um maior ganho de peso, maior produção de leite. Por exemplo, a região sul do Brasil, ela é caracterizada pelo maior número de animais taurinos, porque a região sul tem um clima diferenciado do resto do Brasil. Você tem regiões que dá até aquela nevinha. Santa Catarina tem umas cidades bem frias. Então a região sul é um caso a parte, digamos assim. Eu até brinco, eu falo assim, os gaúchos não sabem fazer churrasco. Eles não são bons churrasqueiros.
Rodrigo Polesso: Olha, vai me ofender. Ei Souto, ferrou agora…
Dr. Souto: Há controvérsias…
Anna Flavia: Vou explicar, vou explicar… gaúcho não é bom açougueiro, ele é na verdade detentor da melhor genética do país, de gado. Vocês tem animais com a maior, os taurinos que tem no sul, maior gordura entremeada, o marmoreio, que a gente tanto vê quando você vai no restaurante né, tem aquela carne gourmet, é de animais taurinos…
Dr. Souto: Então quando a gente vê no supermercado aqui Angus, Hereford, Wagyu, é isso aí que você ta falando?!
Anna Flavia: Tudo taurino! É, Wagyu, gado japonês… é taurino.
Dr. Souto: Pô, que droga, eu achei que eu era bom na churrasqueira…
Anna Flavia: Não, não… é porque o seu gado é melhor do que o meu. Eu tenho obrigação de ser boa açougueira, porque o meu gado é… não é ruim, tem gente que vai me odiar por eu estar falando isso, mas é um fato entendeu, a carne dos taurinos é melhor. Tanto é melhor que no Brasil a gente tem o cruzamento de raças, ta sendo muito utilizado na pecuária. Pra que? Pra melhorar a qualidade da nossa carne. Mas aí voltando, esses taurinos, eles tem pelo longo, pele clara, que não e uma coisa boa pro nosso clima do Brasil. Então vamos supor, eu pego um touro angus e trago ele pra cá, na minha fazenda no Goiás, ele vai conseguir cobrir uma vaca? Cruzar com uma vaca? Em plena luz do dia, meio dia, sol rachando? Não vai, entendeu… ele vai ganhar peso num ambiente quente assim? Não vai. Então assim, a gente tem, a pecuária ela tem que ser feita de acordo com a zona, com o ambiente que a fazenda pertence.
Rodrigo Polesso: É, e aproveitando esse assunto agora que você que você falou, da zona, do ambiente… muito tem se falado aí uso e terra para pecuária, e também para agricultura. Eu não sei se você tem, se podia dar uma noção pra gente, em termos de Brasil, qual a proporção das terras ou porcentagem das terras do Brasil que são mais propícias para o cultivo de gado, e qual porcentagem que é mais propícia para a criação de monocrops, da agricultura em geral. Só pra ter uma ideia mais ou menos de como se divide, como as terras no Brasil estão sendo usadas, e o potencial que isso tem.
Anna Flavia: Eu tenho a porcentagem aqui da quantidade de áreas de lavoura e pecuário, que ver ó… o último senso, isso daqui eu peguei no site do ministério da agricultura e pecuária, a última atualização foi em janeiro de 2019. Nós temos, peraí, aqui ó, são 244 milhões de hectares pra agropecuária. Só que desses 244 milhões, 7% é pra produção de grãos, 18% é de pastagens, 1% floresta plantada, 1% cana-de-açúcar, e 0.7% de banana, café, mandioca, cacau e outras. Então a gente tem no Brasil um maior número de áreas de pastagens do que de lavoura, só que aí eu vou contar uma coisa pra vocês… a pessoas vai falar assim “ah, então a pastagem degrada, a pastagem é que mais degrada, que mais abriu área, que mais desmatou”… não, 25% da superfície terrestre é pastagem. Naturalmente se você for em qualquer livro de biogeografia, ou de geografia, a terra se move, certo? Então florestas no mundo inteiro são reduzidas em detrimento de abertura de certas áreas, que a gente chama de áreas abertas. Por exemplo, meu projeto de pós-doc, eu estudo animais correspondentes a diagonal de áreas abertas. Então a redução e o aumento de florestas, a redução e o aumento de áreas abertas, como as pastagens, as savanas, é natural. Você via ter épocas da vida, sei lá, mas isso demanda muito tempo, sei lá, muitas centenas de anos florestas tiveram tamanho, aí passou o tempo a floresta reduziu, então independente se não existisse pecuária, se não existisse agricultura, as florestas iam ser reduzidas por conta da…
Dr. Souto: Uma coisa que eu acho importante salientar para as pessoas, primeiro é isso que você falou, existem grandes áreas de pastagens, nós tamos falando de grandes partes do mundo, você disse 25% da superfície terrestre, tirando os oceanos né… são pastagens naturais, e essas pastagens o gado pode transformar aquela água que cai ali da chuva, aquele sol que bate ali no capim, aquele capim que já ta ali, em comida pro ser humano, sem degradar o meio ambiente, correto? Pelo contrário, ele ajuda a adubar o meio ambiente. Enquanto que se você transformasse pastagem em terra de agricultura, aí você começa a degradar aquilo ali, a medida que você destrói aquele bioma original pra plantar uma monocultura.
Rodrigo Polesso: Uhum… é um ótimo exemplo disso, até aqui no Canadá, o segundo maior país do mundo, a gente vê na parte norte, como por causa da temperatura tem muito pouca árvore, e a floresta vai meio num gradiente diminuindo a medida que você sai daqui, da divisa com os Estados Unidos. E o que acontece são exatamente isso, a gente chama da grasslands, que são essas pastagens naturais, onde por milênios a gente tem todos animais lá correndo e pastando automaticamente, e não empobrecendo aquela terra, mas mantendo o ciclo rico dela né?!!Então isso leva a gente até a perguntar, a questionar talvez Anna Flavia, o impacto do uso da terra, no caso, quando você tem a pecuária extensiva, como é feito no Brasil com o gado na grama, defecando na grama, tomando água da chuva, enfim, participando do ciclo natural da terra, em contrapartida a gente pode comparar com é feito um manejo um pouco mais “artificial” de uma plantação de soja por exemplo, e como é que essas duas coisas se diferenciam e como é que elas pode talvez numa outra esfera serem integradas de forma otimizada.
Anna Flavia: E só mais um detalhe tá?!! Embora esse dado que eu dei pra vocês, 18% das terras são pastagens no Brasil, e 7% são grãos, a gente sabe que a grande maioria das pastagens, pastagens plantadas que a gente fala, elas se originaram a partir da agricultura. Primeiro abriu-se a área, florestas, áreas naturais para a agricultura. A agricultura tem o costume… por exemplo, numa lavoura de soja, você não vê nenhuma árvore. Então pra agricultura você desmata tudo, todo componente arbóreo, e depois que você tira a agricultura e insere a pecuária, ou seja, forma uma pastagem ali naquele local, é que você pode incluir algum outro componente arbóreo. Então assim, a maior parte das pastagens, elas foram formadas a partir dos campos que tinham lavoura.
Rodrigo Polesso: Ressuscitaram as mesmas terras vocês quer dizer?!!
Anna Flávia: É, mesma terra…
Dr. Souto: Então dá pra dizer de outra forma que o que mais desmatou, pra começo de conversa, é a agricultura. E uma vez que aquela terra foi bastante explorada pra agricultura e daqui a pouco já não tem mais a mesma fertilidade, porque você vai drenando aquele solo, bom, daí aquela terra acaba se regenerando na forma de pastagem, e aí você tem ali o gado. E, dá pra gente dizer Anna Flavia, me corrige seu eu tiver errado, que a biodiversidade é muito, mas muito maior numa pastagem do que numa lavoura, correto? Porque uma lavoura por definição ela costuma ser uma terra que foi arada, foi destruída, cuja cobertura foi eliminada, e na qual são plantadas em geral uma cultura única, e qualquer outra espécie que tenta nascer ou viver ali é destruída por herbicidas. Então, sim, nós sabemos que é possível fazer agricultura de outra forma, nós sabemos que é possível, mas não vamos comparar o nível de biodiversidade né…
Anna Flavia: É, e pra formar pastagem você também usa, pra formar pastagem você utiliza os mesmos recursos da agricultura. Por exemplo, você pode botar herbicida e tal, só que o animal precisa de um mínimo de sombreamento, o animal precisa de ter um mínimo de conforto térmico. Então o pecuarista quando vai estabelecer uma área de pastagem, se naquela área não tem nenhuma árvore, ele planta, entendeu, ele planta…
Dr. Souto: Isso aqui no Rio Grande do Sul, não sei no resto do país, aqui se chama capão… é assim que chama por aí no resto? Então capão são aquelas plantações de árvores, como se fosse uma mini floresta que é plantada a cada x quilômetros para que o gado extensivo possa procurar sombra né…
Anna Flavia: E o pecuarista também gosta de deixar, por exemplo, se naquela área você tem árvores frutífera, ele deixa, porque o gado gosta. Por exemplo, cai um mamão, cai sei lá, qualquer outra fruta, o gado vai lá e come, aproveita né!
Rodrigo Polesso: Sim! O uso da terra, eu acho que isso é importante! Se a gente tem uma fazenda digamos, uma fazenda bem grande, sensível, criação de gado de pasto solto, tudo bem, como é feito no Brasil em muitas áreas. A gente consegue seguir em frente com essa pecuária dessa forma, nesse mesmo solo, com essa grama, com tudo assim, por 20, 30, 40, 50 anos assim? Porque na monocultura eu não sei como é que se compara essas duas coisas, usa a terra pra soja, pro milho, comparado ao uso, por um longo período de tempo de uma pastagem, de um regime do gado assim…
Anna Flavia: Não, não é possível. Tanto não é possível você permanecer igual, que os agricultores fazem assim; por exemplo, eles um tempo eles plantam soja, aí na próxima safra tem que plantar feijão, aí na próxima safra tem que plantar outro grão. Eles tem que ficar fazendo o que eles chamam de rotação de culturas. Porque se não fizer a rotação de culturas você vai exigir do solo, digamos assim, você vai estragar o solo tanto que depois eles não vão conseguir usar. Até eu tava lendo esses dias, falando assim, que na agricultura, os produtores de grãos, eles sabem que se numa safra foi muito boa, na próxima eles já esperam uma safra ruim, entendeu?!
Rodrigo Polesso: Sim, sim… mas no caso da pecuária, na criação de gado, como é que funciona essa terra? Ela empobrece ao criar gado extensivo de grama ao longo de 20, 30 décadas? Como é que funciona comparando os dois?
Anna Flavia: Não… pra começar, o pecuarista ele tem a cabeça diferente do agricultor, no sentido assim, as pessoas acham que o pecuarista não, que ele detona o meio ambiente, que ele degrada, mas o pecuarista ele praticamente não mexe no meio ambiente. Ele tem, a gente tem criação de animais em pastagens naturais, ou seja, tá ali o ambiente natural, o gado só entrou ali e ta engordando ali, crescendo e engordando ali. Mas na pastagem plantada, o pecuarista não tem a cultura de ficar botando fertilizantes e produtos químicos…
Rodrigo Polesso: A vaca já faz isso de alguma forma…
Anna Flavia: A vaca já faz isso exatamente… exatamente…
Dr. Souto: Porque esses dias num programa de televisão aí, pessoas que são do meio artístico e não tem a menor noção do que tavam falando, tavam dizendo que os animais defecam no pasto e isso seria uma coisa poluidora. Comente Anna Flavia, por favor…
Rodrigo Polesso: Se tem como comentar né seriamente…
Anna Flavia: Tem, eu tenho como comentar sim… tanto o uso de fertilizantes e outros adubos são pouco utilizados na pecuária, que se você faz o uso de adubação intensiva numa pastagem, o gado passa a não aceitar muito. Então você ainda tem isso, o gado ele meio que controla a ação do pecuarista. Porque adubações muito pesadas na pastagem, você tem a rejeição do gado por aquela pastagem…
Rodrigo Polesso: Então as fezes do gado não seria tóxica certo?
Dr. Souto: Ou seja, criar gado é uma das coisas mais ecologicamente correta que você pode fazer numa pastagem…
Anna Flavia: Exatamente!
Rodrigo Polesso: Então se eu tiver uma fazenda e tiver criando gado lá, eu posso criar por 10, 15, 20 gerações daquela mesma terra com grama, sem risco de empobrecer o solo.
Anna Flavia: Olha, é o seguinte… é ruim você usar sempre… a gente tem plantas perenes, que vivem a vida toda, digamos assim, pastagens que duram seus 10, 15 anos. E você tem culturas anuais. Da mesma forma que não é legal você fazer a monocultura, a lavoura, a monocultura de grãos, também não é legal você ter a monocultura de capim. E falando sobre essa questão de capim, a gente tem o que a gente chama de consórcio de gramíneas e leguminosas. Você pode tanto plantar na mesma área, uma gramínea, porque o gado também come leguminosa tá? Existem leguminosas forrageiras tá? Amendoim forrageiro, por exemplo, feijão, leucena, e uma série de plantas forrageiras que são leguminosas. Então você pode fazer o consórcio de gramíneas e leguminosas, embora essa prática seja um pouco complicada, porque a gramínea ela cresce, ela desenvolve muito mais que a leguminosa. Só que essa prática é interessante porque a leguminosa, ela fixa nitrogênio no solo, ela ajuda a gramínea com relação a quantidade de nitrogênio. E você pode utilizar também, ao invés de colocar a leguminosa no mesmo passo que a gramínea, você pode utilizar a leguminosa numa outra parte, você tem um piquete só com leguminosa, pro animal ir lá, consumir aquela leguminosa por duas três horas por dia, pra conseguir um aporte proteico maior. Que é o que a gente chama de banco de proteína. Então assim, em nenhum sistema agropecuário, tanto só agricultura ou a pecuária, não é interessante a monocultura, é interessante você ter as culturas perenes claro, mas você sempre tá formando parte da sua fazenda com plantas de culturas anuais.
Dr. Souto: Anna Flavia, e esse pessoal que diz pra nós aí, que o problema, tá bem, então o gado a gente já viu, ele não tem esse impacto ecológico ruim que se imaginava, mas ele é hoje em dia cheio de hormônios e antibióticos e coisas tóxicas…
Rodrigo Polesso: É, isso é importante um ponto
Anna Flavia: kkkkkkkkk
Dr. Souto: Que que tem… você como zootecnista explica pra gente, explica pra nós aí, o que é mito e o que é verdade…
Anna Flavia: É que é o seguinte ó… Eu tô até com a lista aberta aqui, a gente tem, o ministério da agricultura… isso ta no site lá tá gente? Qualquer um pode ir lá, o documento se chama substâncias proibidas, você vai no site tem um mecanismo de busca, campo pra busca, você coloca “substâncias proibidas”, e aí ó, eu vou dar só um exemplo pra vocês, substâncias naturais ou artificiais com atividades anabolizantes hormonal em bovino de corte estão proibidas desde 2011…
Dr. Souto: Mas esse pessoal todo que ta falando isso no Instagram então está equivocado?
Anna Flavia: Com certeza, é lei… o produtor não pode sair “chuchando” hormônio em bicho a torto e a direita, entendeu? Por exemplo beta agonista em bovinos proibido desde 2012. E a gente tem tantas outras substâncias que, proibidas, de aves por exemplo, desde 2014. Isso porque nunca foi colocado hormônio em aves, mas enfim…
Dr. Souto: Só um pouquinho, vamos repetir isso, porque eu ouço todo santo dia no meu consultório…
Rodrigo Polesso: O hormônio do frango né…
Dr. Souto: a pessoa diz assim: “eu não tenho como fazer essa low carb, porque a carne é cheia de hormônio de crescimento, e as aves então é puro hormônio. Por que como é que explica porque o frango agora é tão grande e era menor na época da minha avó?”. Explica pra nós Anna Flavia, por favor…
Anna Flavia: Sobre o frango? É o seguinte, as aves elas foram selecionadas para o maior ganho de peso. O que a gente chama de melhoramento, seleção massal, seleção de desempenho tá? Ninguém fez um animal extra, ninguém produziu um animal de laboratório, uma coisa extraterrestre não. A gente simplesmente selecionou os frangos que tinham maior ganho de peso e acasalou esses animais. Ponto. Ao longo de muitas e muitas gerações, muitos e muitos anos. Atrelado a isso você teve melhoras na questão nutricional, atrelado a isso você teve melhoras nas questões sanitárias, medicamentos. Melhoras no manejo dos animais. Práticas de bem estar. Então os animais cresceram, os animais conseguiram ganhar mais peso, sendo produzidos… consumindo a mesma quantidade de ração no mesmo local, sem precisa aumentar a área. E desde 2004 que é proibido hormônio em aves.
Dr. Souto: Então tá! Pessoal, se vocês acham impossível acreditar nisso que ela falou porque artistas falam diferente no Instagram, vamos pensar uma coisa mais simples assim, pensa num cachorrinho dessas raças pequena, um chihuahua, um Yorkshire, cachorrinho pequeno… agora pensa num daqueles grandes, um weimaraner, um fila, um pastor alemão… como é que um é tão grande e outro é tão pequeno? Porque os nossos antepassados, nós não tamos falando de milhares de anos, nós tamos falando de décadas, no máximo séculos, começaram a cruzar bichos um pouco maiores e bichos um pouco menores e é possível sim produzir um baita cachorro ou um cachorro bem pequeninho que cabe na bolsa da madame. Só por cruzamentos genéticos. E nós não estamos falando em engenharia genética, coisa de laboratório. Nós tamo falando em cruzamento. Pega assim ó, nasceu uma ninhada, tem um bicho maiorzinho, aí tem uma outra ninhada e tem um maiorzinho, cruza os dois e os filhotes tendem a ser maiorzinhos. É simples assim.
Anna Flavia: Uhum… é, as bio tecnologias reprodutivas usadas na pecuária, elas estão avançando bastante, elas tem uma série de vantagens. Só que o seguinte, elas representam, a inseminação artificial em tempo fixo, como isso acontece?! Aquelas vacas que tão em época de reprodução, elas recebem um hormônio… eu não vou ficar falando aqui em hormônio específicos, porque isso não vem ao caso… mas elas recebem hormônio estimulante, para que elas venham a ciclar, depois elas são inseminadas com sêmen de diferentes touros. Eu, particularmente, não gosto dessa prática, eu sou muito criticada por produtores e colegas meus, porque eu falo que eu não gosto muito dessa prática. Porque ela… aquela vaca, que naturalmente não ia ciclar, ela cicla. Então você ta mantendo um animal ruim de desempenho reprodutivo no rebanho só porque você ta usando hormônio. Mas esses animais, essa prática da inseminação artificial em tempo fixo, ela representa 10% do rebanho nacional. O que é 10% do rebanho nacional? E ainda mais se você for pensar que o abate de fêmeas é bem menor que o abate de machos, entendeu?!
Dr. Souto: E outra coisa Anna Flavia, pra quem está nos ouvindo, porque aí as pessoas dizem: “aha, usam hormônios”. Pessoal, é usado naquele momento pra induzir o cio em 10% dos animais. Mas esse animal não vai a abata enquanto esse hormônio está circulando e presente na carne?! Correto? Explica pra nós, explica pra ficar bem claro pra eles.
Anna Flavia: Tem o período de carência sim. E assim ó, por que as fêmeas são descartadas? Digamos assim, ah, o produtor foi lá, contratou um veterinário, ele induziu o cio da vaca, a vaca não entrou em cio, ou entrou em cio mas não conseguiu pegar pranhês. Aí aquela vaca foi descartada do rebanho, foi mandada pro frigorífico. Você acha que as vacas são descartadas porque estão gordas? Não, vaca só é descartada, problemas reprodutivos são na sua grande esmagadora maioria de fêmeas muito magras. Então aquela fêmea sai da estação de reprodução e vai… pode ir, por exemplo, para um programa de confinamento. Aí ela fica 120 dias sendo alimentada, da forma como a gente já explicou, e nesses 120 dias… isso é o mínimo tá? Pode ser até que ela fique por mais tempo. Ou seja, o período de carência do hormônio ali, daquele tratamento hormonal pela qual ela passou já foi, já foi. Quando ela vai ser abatida ela não tem mais aqueles hormônios circulando no corpo.
Dr. Souto: Isso aí pessoal, então pra vocês entenderem, isso vale pra qualquer medicação… existe um conceito que se chama meia vida. Então por exemplo, por que eu tenho que tomar uma dipirona se eu to com febre de 6 em 6 horas? Porque depois de 6 horas já passou algumas meias vidas daquele produto. Ele já ta sendo eliminado do corpo. Tudo bem que um determinado hormônio tenha, sei lá, 2 ou 3 dias de meia vida, se você esperar 2 ou 3 meses não tem mais hormônio na carne. Isso precisa ficar bem bem bem claro. E quando você fala que a vaca vai lá pro confinamento, esse confinamento é uma espécie de tortura pra vaca? Como que é isso?
Anna Flavia: Claro que não! Elas ficam num lugar em conjunto, você tem todo um dimensionamento de cocho. Por exemplo, o cocho ali é dum tamanho que cabe a cabeça de cada animal que você colocou ali dentro entendeu? Se todos quiserem comer naquele mesmo momento eles podem, tem espaço suficiente pra isso. Os animais tem espaço livre pra circular, pra tomar sol, tomar água…
Dr. Souto: Ó pessoal, entendam isso, eles tomam sol, tomam água, eles circulam, eles caminham… existe espaço pro animal circular. Então não vamos cair em vídeo de propaganda, não vamos fantasiar. Vamos ouvir opinião de quem trabalha com pecuária, com quem trabalha com animais…
Anna Flavia: Os confinamentos no Brasil são no sol, os animais estão no sol a pino. Pode ver quando você anda nas estradas e vê um confinamento, a gente vê um confinamento, os animais estão no sol.
Dr. Souto: É que as pessoas na verdade nunca viram isso na frente dela, elas tão vendo documentários de propaganda no Youtube…
Anna Flavia: Agora eu posso falar um segundo caso em que possivelmente pode ser que utilize hormônio, e aí também entra na questão dos antibióticos, e aí a gente já fecha o assunto?
Dr. Souto: Claro!!
Anna Flavia: Alguém pode vir, algum vegano, não vegetariano, mas algum vegano pode vir reclamar com relação a gado de leite. Lembra que eu falei pra vocês, eu nem cheguei a explicar a questão dos zebuínos. Os animais zebuínos, eles tem uma maior habilidade materna, são mais bravos, então eles dão mais problema na sala de ordenha. Mas a nossa pecuária de leite ela é feita a partir de um animal que chama girolando, que é o cruzamento do gado holandês com animal gir, que é da Índia. Então os animais girolandos, ou da raça gir, que também tem muito em gado de leite, as vezes, são pouquíssimos rebanhos, são casos isolados de alguns produtores, fazem uso de algum hormônio pra descida do leite porque, como falei, são animais mais estressados. Os bezerros precisam ficar ao pé, ou seja, do lado da vaca ali na hora da ordenha, dificulta muito. E gado de leite, quanto mais produtiva é a vaca, mais leite ela produz, mais o úbere trabalha. Então, se o gado não for manejado da forma correta, então você tem aí a maior incidência e mastite, que é a inflamação ali dos canais onde produz o leite no úbere. Então você tem no gado de leite um maior uso de antibióticos por conta da questão de inflamação do úbere. E no gado de leite você também tem o maior uso de alimentos concentrados, os grãos entendeu? A maior oferta de alimento no chocho. Por quê? Porque a vaca sai da ordenha, o esfíncter do teto ta aberto, o teto foi higienizado e tal, passou iodo, a vaca saiu da sala de ordenha, ela não pode deitar naquele momento, ela tem que ficar em pé. Então pro produtor manter a vaca em pé, ela sai da sala de ordenha e vai comer no cocho, entendeu? Mas ela pode comer silagem, ela pode comer feno, ela pode comer o capim que acaba de ser cortado, ela pode comer várias coisas, não necessariamente ração, grãos ou qualquer outra coisa, entendeu?
Rodrigo Polesso: Aham… e antibiótico em gado de corte, como funciona na realidade?
Anna Flavia: É muito pouco, o gado de corte… imagina assim, pensa num bicho resistente, é o gado de corte. O gado de corte ele vai no curral basicamente receber as vacinas, os vermífugos, pra ser inseminados, no caso desses 10% do rebanho que faz biotecnologia. Tem muitos rebanhos agora indo no curral pra passar ultrassonografia de carcaça. A gente faz ultrassonografia pra saber se o gado tem o que a gente chama de área de olho de lombo. É uma parte ali perto da costela que vai te dizer se aquele animal, quando for abatido, se ele vai ter maior quantidade, uma área maior de certos cortes nobres. Então assim, o gado de corte ele passa poucas vezes no curral se for comparado com o gado de leite entendeu? É um gado que praticamente não antibiótico, não tem isso…
Rodrigo Polesso: Então eles não usam antibiótico pra engordar? Porque o pessoal fala “essa carne tá cheia de antibióticos”, então a realidade é essa, eles não usam antibióticos pra engordar o gado?
Anna Flavia: Não existe! Os animais em confinamento… qualquer ser vivo que você confine, você concorda comigo, por exemplo, num hospital cheio de gente, a chance de pagar uma doença ali dentro é maior, a chance de pagar uma doença num show lotado de gente é muito maior…
Dr. Souto: Num avião…
Anna Flavia: É, num avião… do que se você tiver andando na cidade. O gado é a mesma coisa, se ele tiver confinado ali naquele local, por mais que ele tenha espaço de circulação suficiente, que não esteja sofrendo, que é o que acontece, mas ele ta ali numa densidade maior de indivíduos, então ele tem maior chance de adoecer. Então há a possibilidade de utilização de algum tipo de antibiótico, caso venha apresentar alguma doença.
Dr. Souto: Como nós estamos falando dos 12% do nosso gado que é confinado, esse gado só vai ser abatido depois de um período de carência em que esse antibiótico não está mais presente.
Anna Flavia: Tem isso, tem isso…
Dr. Souto: Então tá pessoal, entendam pelo amor de Deus…
Rodrigo Polesso: Como é fiscalizado isso aí tudo? Quão severa é a fiscalização, como é que funciona?
Anna Flavia: Começa a fiscalização… vou começar por uma parte primeiro. A fiscalização é o seguinte; toda fazenda tem a sua inscrição estadual né? O produtor tem lá sua inscrição, se ele vai enviar o gado pra qualquer lugar… se você tem duas fazendas, só que no meio delas tem uma outra fazenda que divide, você tem que pegar a guia de transporte animal. O gado não sai de uma fazenda sem um guia de transporte animal. Se você vai vender aquele gado, além da guia de transporte, tem que ir no caminhão a nota fiscal. O ministério, o MAPA, ministério da agricultura, pecuária e abastecimento, tem todo o controle dessa movimentação de gado no país, porque tem que ter a gta e tem que ter a nota fiscal. Aí beleza… o produtor, vamos supor, mandou o gado pro frigorífico… as pessoas confundem, existe uma coisa chamada certificação e uma coisa chamada registro tá? O frigorífico, seja ele pequeno, médio ou grande, ele tem que ter ou o registro municipal, que quer dizer o que? Quer dize que aquele produto que ele vai vender, seja carcaça, seja peças de carne, ele só vai poder vender no município. Se ele tiver o registro de inspeção estadual ele vai poder vender no estado. Se ele tiver o registro de inspeção federal ele vai poder vender no Brasil inteiro. E quem tem sif geralmente pode exportar, mas aí as condições de exportação são de acordo com cada país. Então isso vale não só pra gado de corte, o registro vale pra qualquer produto de origem animal…
Dr. Souto: E na prática Anna Flavia, na realidade assim os fiscais aparecem nas fazendas, nos frigoríficos? Existe isso?
Anna Flavia: Aparecem sim, com certeza! Com certeza! Beleza! E aí falando na questão da fiscalização, o mapa solta todo ano um relatório tá? Um relatório de análises que ele fez. O último relatório, inclusive, eu botei no meu Instagram, parte desse relatório, e as carnes analisadas, de tantas amostras analisadas, pouquíssimas tiveram algum resíduo de antibiótico ou de hormônio, ou de qualquer outra substância ta? Depois se vocês quiserem, a gente… quando o Rodrigo for transcrever aí no podcast, a gente pode colocar o link pra essas análises. Mas aí falando nas análises, o Brasil tem 2 programas… quer dizer, um programa e um plano, o programa nacional de análise e medicamentos veterinários em alimentos expostos ao consumo humano, que se chama Panvet. Ele é da Anvisa, ele existe desde 2003, ou seja, quantos anos né? Esse Panvet analisa e estabelece limites de resíduos nos bovinos e ambiente. Entendeu? Toda carne que é abatida, todo animal que é levado pro frigorífico passa por essa análise aqui.
Dr. Souto: Você acha que seria correto dizer que seria muito muito maior a chance de eu ter agrotóxicos e pesticidas nos meus produtos de origem vegetal do que hormônios e antibióticos na carne?
Anna Flavia: Eu acho que sim.
Dr. Souto: Acho que sim, é justo né?
Anna Flavia: É justo, é justo.
Rodrigo Polesso: Então por que o ataque todo se concentra na carne né? Podia ser assunto de 15 podcasts.
Anna Flavia: Boa pergunta. E nós temos também o plano nacional de controles de resíduos e contaminantes, que é do Mapa, do ministério da agricultura pecuária e abastecimento. Porque funciona o seguinte, até a carcaça, até o animal chegar no frigorífico e virar carcaça, carcaça é o animal abatido e viscerado, sem rabo, sem pata, sem cabeça. Até esse período, antes de ele virar produto alimentício, o animal é fiscalizado pelo ministério da agricultura, pecuária e abastecimento. Depois que ele vira produto, ou seja, que tem aqueles pedaços de carne, os cortes embalados pra gente poder escolher no açougue, no supermercado, aí já passa a ser fiscalização desse Panvet da Anvisa, entendeu? Então nós temos esses dois controles, Anvisa e Mapa. Fora o fato de que nós temos fiscais o tempo todo nas agroindústrias e eles são muito, muito rigorosos.
Rodrigo Polesso: Então tem punição? Tem punição pra quem fere esses requisitos?
Anna Flavia: Tem. Fecha… fecha frigorífico, fecha laticínio… é assim ó, por exemplo, vou dar exemplo da agroindústria de ovos, que é o que tenho um pouco mais de experiência. A gente tem um centro de processamento de ovos dentro da granja. O ovo sai de lá embalado e tal, pronto pro supermercado. A gente faz análise microbiológica, física, química, dos ovos, da água, de tudo, uma vez por ano. Uma análise completíssima. Mas o fiscal vai lá pelo menos uma vez por mês, e se ele for lá e achar uma mosquinha, achar uma coisinha que ele ache, que ele suspeite, ele manda de novo analisar, entendeu? E assim, o governo, ele tem vários laboratórios credenciados, a gente não analisa produtos de origem animal em qualquer laboratório não, são os laboratórios credenciados do ministério, da Anvisa, são vários. Aí manda pra um laboratório, deu um resultado, e manda pra outro, são geralmente no mínimos dois laboratórios que fazem a mesma análise, você manda duas amostras de cada produto que tá indo, ou da água e tal. E daí se tiver qualquer suspeita, ou multa, dependendo do caso, ou fecha a agroindústria. Nós temos uma fiscalização muito rigorosa. É um absurdo…
Dr. Souto: É! E pessoal, isso aí não é assim porque nossa, nós descobrimos uma coisa que o governo é eficiente. É que a agroindústria carrega o PIB desse país. Então e por isso que a coisa é levada a sério, não é por outro motivo. É porque a agroindústria é o grande sustentáculo da nossa economia. Boa parte da nossa produção é pra exportação. E vocês acham que um navio chega lá com carne que é imprópria pra consumo. Então a coisa tem que ser fiscalizada e a fiscalização ela é exercida nos produtos para consumo interno e externo.
Rodrigo Polesso: Com certeza! Bom, que que a gente viu até agora Anna Flavia? Vamos resumir uns pontos importantes aqui que eu lembro de cabeça. Você falou que no Brasil a grande e vasta maioria do gado é criado a pasto. Somente 12% no final é confinado e esse confinamento não é 100% grão, você falou que é uma ração, e por ração é bem diferente de animais…
Anna Flavia: Pode ser tá?!! Tem alguns confinamentos que fazem sim, a gente chama de confinamento de alto grão, mas não são todos.
Rodrigo Polesso: Ok! Nesse caso que tipo de demanda desse tipo de carne que gera esse confinamento por grão? Que tipo de carne que resulta digamos? Qual a necessidade?
Anna Flavia: Olha, não é por grão… o geral é o seguinte… a carne de confinamento é carne gourmet…
Rodrigo Polesso: É isso que eu queria dizer, exatamente…
Anna Flavia: Quando você vai… ta crescente no Brasil a casa de carnes. É chique você chegar numa casa de carnes e ter aquela vitrine linda assim de carne. Eu não sou contra aquilo, mas aquelas carnes ali vieram de confinamento. Por que? Porque são animais que tem genética pra ganho de peso, que tem genética para marmoreio, e aí foram confinadas… porque assim, por que é importante o gado engordar? Eu queria salientar… o gado ele precisa ter uma quantidade mínima de gordura na carcaça, pra proteção do frio. Quando o animal é abatido se ele tá magro, o frio lá do frigorífico, porque precisa ter uma refrigeração na carne, a carne endurece. As enzimas que estão ali agindo na carne, enzima do animal tá, não tem nada a ver, não tem nada de produto químico, não vão achar que é alguma coisa adicionado, não. As enzimas ali do pós mortem do animal, endurecem a carne, se a carne não tiver com uma gordura de cobertura, e tiver sob refrigeração. Então o animal engordar tem esse detalhe. É proteção da carne no frigorífico.
Rodrigo Polesso: Uhum… então desse que faz só grãos você diria que é uma porcentagem, bom, pequena no Brasil pelo que você disse só pra gente saber…
Anna Flavia: É pequena porque a gente sabe que quanto maior a quantidade de grãos, maior o risco, maior a chance de desordens metabólicas. Por mais que o gado aguente e a gente faça essa transição, digamos assim, vai aumentando aos poucos, semana a semana a quantidade de grãos, a gente sabe que não é o ideal. E outra, o que as pessoas, o pessoal, a gente poderia frisar isso, grãos é caro pro produtor no Brasil. O grão só é mais barato do que pastagem, do que silagem, do que outros alimentos, nas zonas temperadas. Entendeu?! No Brasil o grão é caro, por isso que não tem tanto confinamento só de grãos.
Rodrigo Polesso: Certo, então 88%… o fato é 88% pelo menos do gado no Brasil é 100% a pasto durante a vida dele inteira né? É isso mesmo?
Anna Flavia: É, 88%… isso, 100% a pasto…
Rodrigo Polesso: E o pessoal que ta comprando carne no mercado pode ficar tranquilo sobre esses fantasmas do hormônio e do antibiótico, isso é muito bem fiscalizado, esses resquícios é bem fiscalizado. Então não existe essa coisa de a carne ta cheia de hormônios e cheia de antibióticos…
Dr. Souto: É, e eu até acho viu Rodrigo, que um dos grandes argumentos a Anna Flavia falou aí é o argumento econômico, quer dizer, se eu tenho um animal robusto e criado a pasto, é óbvio que custa dinheiro ficar dando antibióticos e hormônios, o bicho cresce com grama e água da chuva né?! Então quer dizer, não faria sentido, seria antieconômico, da mesma forma criar puramente com grãos, seria além de causar desordens metabólicas no animal, não é, simplesmente não é possível criar puramente com grãos… mas esses grãos que são acrescentados no final, na fase de engorde, são misturados com uma maioria de feno, capim, forragem e silagem. E os grãos eles tem custo para o produtor, diferente da situação dos Estados Unidos, que é o que aparece no Youtube e nos documentários, nos quais os governos subsidia os grãos, eles ficam tão, mas tão baratos, bom, não tem gente suficiente para comer todos aqueles grãos, eles são dados pro gado.
Anna Flavia: Outra coisa com relação a parte econômica dos confinamentos, pra um confinamento ser realizado, ele precisa de toda uma estrutura né?!! Você precisa montar uma estrutura de cocho de água, para os animais ali, de cercar aquela área ali onde os animais vão ficar. O fornecimento daquela ração que é batida diária, que é feita diária, não importa a composição dela, se é mais grãos ou menos grãos, aquilo tudo demanda trabalho e investimento, e no Brasil a gente não tem isso. Nos Estados Unidos, por exemplo, você troca o trator assim como a gente troca um celular. No Brasil não é todo mundo que tem trator, não é todo mundo que tem implemento agrícola que facilite esse arraçoamento, ou seja, esse fornecimento da ração no cocho. Então confinar gado não é barato no Brasil. Por isso que a gente só tem 12% dos animais. E ta crescendo por que? Porque o consumidor ta pedindo carne gourmet, entendeu?
Rodrigo Polesso: Certo! Muito bom, muito bom. Dr. Souto, Anna Flavia, vocês querem adicionar mais alguma coisa nesse nosso contexto e como funciona a pecuária no Brasil?
Dr. Souto: Bom, eu achei sensacional aqui. Eu tô, logo logo esperando o próximo episódio que eu acho que vai ser melhor ainda.
Rodrigo Polesso: É, no próximo a gente vai tocar nos ponto do meio ambiente, como é que impacta isso, e falar também, deixar claro algumas coisas…
Dr. Souto: Vamos deixar aqui o, como é que se diz, cenas do próximo capítulo, será que você está contribuindo para o aquecimento global? Será que a seca que ocorreu em São Paulo é porque você comeu um filé?
Rodrigo Polesso: Exatamente! Isso e muitas outras coisas no próximo capítulo da conversa com a Anna Flavia! Então esse podcast resumiu então em mostrar um pouco mais de quem entende, de quem entende como funciona a prática da pecuária no Brasil, como é fiscalizada e como é na realidade. Então você, por favor, passe adiante, referencie isso aí e siga nós no Instagram. Anna Flavia, qual o seu Instagram lá pro pessoal seguir e ver os passos que você posta lá?
Anna Flavia: @doutora_annaflavia
Dr. Souto: Anna Flavia tem dois “N” né?
Anna Flavia: Isso, exatamente, eu esqueço.
Rodrigo Polesso: Doutora Anna Flavia é zootecnia, tá pessoal? Maravilha! Dr. Souto já sabe é @jcsouto e eu sou @rodrigopolesso. E com isso então você fica aí com esse podcast completinho! Pra mais informações sobre a Tribo Forte é só entrar em triboforte.com.br . Ah, eu tava quase esquecendo, eu não posso deixar de falar essa parte, que é o que a gente degustou na última refeição. Porque é tradição desde o primeiro episódio. Então todo episódio aqui, Anna Flavia, a gente pergunta, a gente compartilha o que a gente degustou na última refeição, então você como é a convidada caloura aqui vai responder primeiro, vai ter a honra de responder primeiro o que você teve aí no seu almoço no caso.
Anna Flavia: Bom, o meu almoço foi basicamente carne moída e 3 ovos fritos com aquela geminha mole que eu amo! Esse foi meu almoço!
Rodrigo Polesso: Hehe, sensacional! Simples e nutritivo! Dr. Souto?
Dr. Souto: Salmão com molho de mostarda.
Rodrigo Polesso: Nossa, que coisa mais fancy… mostarda é…
Dr. Souto: E se tivermos um terceiro podcast nós vamos depois falar de piscicultura e peixes criados em piscicultura.
Rodrigo Polesso: Que também é outra né?!! Que também é outro assunto…
Dr. Souto: Que é outro mito também, acho que vale, temos que achar… hein pessoal, se alguém aí trabalha com isso e quiser nos, é tem que conhecer, que nem a doutora Anna Flavia, entra em contato aí com a Tribo Forte.
Rodrigo Polesso: Isso, manda um email lá! Eu comi um carneiro, carneirinho, muito bom, carré de carneiro, que coisa deliciosa. Meu Deus do céu! Tem até o ossinho pra segurar. É coisa que foi feita pra ser degustada! Enfim, todos nós então aí tirando proveito aí, de consciência tranquila. Sobre o meio ambiente é o podcast que vem, então segure as pontas aí pessoal, que no podcast que vem vamos falar sobre pecuária e impacto no meio ambiente também. Então é isso aí pessoa, obrigado pela atenção! Obrigado Dr. Souto, muito obrigado Anna Flavia pela atenção e pelas informações também, e a gente se fala no próximo!
Dr. Souto: Obrigado, até lá!
Anna Flavia: Até mais!