Bom dia,
O assunto de hoje colocou lágrimas nos meus olhos.
Eu me dei ao trabalho de traduzir aqui neste artigo a palestra recente do Dr. Peter Attia, um dos médicos que eu mais respeito no mundo, para o evento TED Med nos EUA.
Este é um dos grandes profissionais que está indo contra a maré da convenção médica sobre obesidade, diabetes e resistência à insulina e focando em rever todos os conceitos que são tidos como certos hoje pela comunidade médica mundial.
A palestra dele foi extremamente comovente e eu não pude conter a água nos olhos ao assistir e sintonizar perfeitamente com tudo o que ele disse.
Se você não entende inglês, leia abaixo a transcrição e depois veja o vídeo para que possa sentir o que estou dizendo.
Será possível que quase tudo que é dito por aí sobre tratamento de obesidade e diabetes esteja simplesmente errado? (minha opinião: sim)
Será possível que estejamos cometendo a maior injustiça de todos os tempos ao julgarmos os obesos de serem preguiçosos e comerem demais? (minha opinião: sim)
Será mesmo que tudo é tão simples quanto a sugestão comum (e ignorante) de se “fechar a boca”? Será que isso também explica um pouco a existência de um enorme número de médicos que estão acima do peso eles mesmos e continuam sugerindo tratamentos ineficazes ao seus pacientes?
A minha avó faleceu à alguns anos atrás por causa da diabetes e pelo terrível tratamento que ela estava seguindo, por confiar na opinião dos seus médicos que, na época, a atenderam e achavam que aquele era, de fato, o melhor tratamento.
Minha mãe acha que isso poderia ter sido evitado se tivesse acontecido nos tempos atuais. Eu, tristemente, tive que discordar e dizer que, sinceramente, acho que hoje ela teria tido o mesmo exato tratamento que recebeu na época.
Sem mais, segue a transcrição:
Dr. Peter Attia, palestra para o TED Med
“Eu nunca vou esquecer aquele dia na primavera de 2006. Eu era um cirurgião residente no Hospital John Hopkins.
Recebendo chamadas de emergência, eu fui chamado pela sala de emergência as 2 da manhã para ir ver uma mulher com uma úlcera no pé, causada por diabetes.
Eu consigo ainda lembrar aquele cheiro de carne apodrecendo quando puxava a cortina para vê-la.
Todo mundo lá concordava que aquela mulher estava bastante doente e precisava estar no hospital, mas a pergunta que me faziam era se ela também precisaria de uma amputação.
Agora, olhando novamente para aquela noite, eu quero acreditar que eu tratei aquela mulher com a mesma empatia e compaixão com que eu tratei uma mulher de 27 anos de idade que veio para a emergência 3 noites antes com dor na parte debaixo das costas, que acabou sendo causada por um câncer avançado no pancreas.
No caso dela, não tinha nada que eu pudesse fazer para salvar a sua vida, pois, o câncer estava muito avançado.
Mas eu estava determinado a fazer tudo que fosse possível para que ela ficasse mais confortavel. Eu trouxe para ela um cobertor quente e um copo de café. Trouxe também para os pais dela.
Mas o mais importante é que eu não fiz nenhum julgamento a respeito dela, por que, obviamente, ela não fez nada para trazer este mal para ela mesma.
Então, por que, apenas algumas noites depois, quando estava naquela mesma sala de emergência e determinando que minha paciente diabética, de fato, precisava de uma amputação. Por que eu a julgava de forma tão amarga?
Você vê, ao contrário da mulher anterior, esta tinha diabetes do tipo 2. Ela era gorda e nós todos sabemos que isso é por que comemos demais e nos exercitamos muito pouco. Então, quão difícil seria não fazer isso?
Eu pensei comigo mesmo, “Se você tentasse se esforçar só um pouquinho, você não estaria nesta situação, neste momento, com um médico que você não conhece, à um passo de amputar o seu pé.!”.
Por que eu me sinto justificado em julgar ela?
Eu gostaria de dizer que eu não sei, mas eu, na verdade, sei.
Sabe, naquela época, eu achava que eu já entendia tudo. Ela comeu demais, ela deu azar e pegou diabetes, caso fechado!
Ironicamente, naquele momento da minha vida, eu também estava pesquisando sobre câncer, melanoma baseado em imunidade.
Naquele cenário, eu fui instruído a duvidar de toda e qualquer suposição e sempre priorizar os padrões científicos mais altos.
Ainda, quando se tratava de uma doença como a diabetes, que mata 8 vezes mais americanos do que melanoma, eu nunca questionei o senso comum!
Eu simplesmente assumia que a sequência de patologias era ciência certa e indiscutível.
Três anos depois, eu descobri o quão errado eu estava. Mas, desta vez, eu era o paciente.
Mesmo me exercitando 3 ou 4 horas, todo santo dia e seguindo a pirâmide alimentar à risca, eu ganhei ganhei bastante peso e desenvolvi algo chamado de síndrome metabólica.
Eu me tornei resistente à insulina.
Você pode pensar da insulina como este hormônio mestre que controla o que o nosso corpo faz com o que comemos, se queimamos ou se armazenamos. Isso é chamado de particionamento de combustível.
Agora, falhar na produção de insulina suficiente é algo incompatível com a vida e resistencia à insulina, como o nome sugere, acontece quando nós nos tornamos mais resistentes à insulina quando ela tenta fazer o seu trabalho.
Uma vez que você está resistente à insulina, você está no caminho para desenvolver diabetes que acontece quando seu pâncreas não consegue mais seguir o ritmo e produzir insulina o suficiente.
Agora, seus níveis de açúcar no sangue começam à subir e uma cascata inteira de eventos patológicos começam a acontecer sem controle, o que leva à doenças cardíacas, câncer, doença de Alzheimer e amputações, como no caso daquela mulher alguns anos antes.
Assustado, eu comecei a mudar minha dieta radicalmente, fazendo coisa que tenho certeza que a maioria de vocês acharia chocante.
Eu fiz isso e perdi 20 kg, enquanto me exercitava menos. Como vocês podem ver, eu não estou mais acima do peso e, mais importante ainda, eu não tenho mais resistência à insulina.
Mais importante, eu acabei ficando com 2 grandes perguntas que não queria desaparecer:
Como isso aconteceu comigo, uma vez que eu estava, supostamente, fazendo tudo certo?
Se o conhecimento convencional sobre nutrição não deu certo pra mim, seria possível que ele também estaria enganando mais gente?
E por estas perguntas, eu me tornei quase loucamente obsecado tentando entender a verdadeira relação entre obesidade e resistência à insulina.
Agora, a maioria dos pesquisadores acredita que obesidade é a causa da resistência à insulina. Desta forma, se você quer tratar a resistência à insulina, você fala pras pessoas perderem peso, certo? Você trata a obesidade.
Mas e se nós entendemos isso do jeito contrário do que é na verdade?
E se a obesidade não for, de forma alguma, a causa da resistência à insulina?
Na verdade, e se ela for um sintoma de um problema ainda mais profundo? A ponta de um iceberg.
Eu sei que isso parece loucura, por que nós, obviamente, estamos no meio de uma epidemia de obesidade, mas, me escutem.
E se a obesidade for uma forma de o corpo lidar com um problema ainda mais grave no nível celular. Eu não estou sugerindo que obesidade é benígna. Mas o que eu estou sugerindo é que, talvez, ela seja o menor de dois males metabólicos.
Você pode entender resistência à insulina como sendo uma capacidade reduzida das nossas células de particionarem combustível, como mencionei um momento atrás, ou seja, pegando aquelas calorias ingeridas e queimando algumas e armazenando outras apropriadamente.
Quando nós nos tornamos resistentes à insulina, a homeostase desvia deste estado equilibrado. Então agora, quando a insulina diz para uma célula: “Eu quero que você queime mais energia!”, a célula responde: “Não obrigado, eu prefiro, na verdade, armazenar esta energia.”.
E, devido ao fato de que, as células de gordura não possuem a maior parte dos mecanismos complexos de outras células, elas são, provavelmente, o lugar mais seguro de se armazenar esta energia.
Então, para muitos de nós, por volta de 75 milhões de americanos, a resposta apropriada para resistência à insulina pode ser armazenar energia como gordura e não o inverso, ou seja, desenvolver resistência à insulina por se tornar gordo.
Esta é uma distinção muito pequena, porém, as implicações poderiam ser profundas.
Considere a analogia seguinte:
Pense no roxo que você cria quando você, distraído, acerta a sua perna na mesa de café. Claro, dói pra caramba e você, com certeza, não gosta da cor roxa que aparece.
Mas nós todos sabemos que o roxo em si não é o problema. Na realidade, é o oposto, ele é uma resposta saudável ao trauma causado. Todas as células de imunidade correndo para o lugar da lesão para evitar que o problema se alastre para o resto do corpo.
Agora, imagine que nós achássemos que o roxo fosse o problema e que fosse desenvolvida uma enorme cultura médica a cerca do tratamento destes roxos. Cremes para tirar a cor, analgésicos, etc. Tudo isso, ignorando-se o fato de que as pessoas ainda continuam acertando a perna em mesas de café por aí!
Quando melhor seria se nós tratássemos a causa e não a consequência? Ou seja, dizendo pras pessoas terem mais atenção ao andar perto dessas mesas. Entender a causa e consequência de forma correta faz toda a diferença no mundo! Entendendo-as de forma errada, as empresas farmacêuticas ainda farão muito dinheiro para seus acionistas, mas isso não irá ajudar em nada as pessoas com roxos na perna.
Causa e consequência. Então, o que eu estou sugerindo é que, talvez, tenhamos um entendimento errado da causa e consequência da obesidade e resistência à insulina.
Talvez nós devessemos estar nos perguntando: “Seria possível que a resistência à insulina causasse o ganho de peso associado com a obesidade, ao menos, na maioria das pessoas?”
E se ser obeso for apenas uma resposta metabólica do corpo à algo muito mais ameaçador? Uma epidemia por baixo disso tudo, aquela, com a quão, nós precisamos nos preocupar.
Vamos olhar para algumas consequências. Nós sabemos que 30 milhões de americanos nos Estados Unidos não têm resistência à insulina e, a propósito, eles não parecem terem riscos maiores de doenças do que pessoas magras.
Por outro lado, nós sabemos que 6 milhões de pessoas magras, nos Estados Unidos, possuem resistência à insulina e, a propósito, eles parecem ter riscos ainda maiores para doenças metabólicas do que seus amigos obesos.
Agora, eu não sei o porquê, mas pode ser que as células destas pessoas ainda não descobriu o que fazer com aquela energia extra. Então, se você pode ser obeso e não ter resistência à insulina e ser magro e ter, isso sugere que obesidade pode simplesmente um sintoma do que realmente está acontecendo.
Então, e se nós estamos lutando a guerra errada? Lutando a obesidade ao invés da resistência à insulina. Ou, ainda pior, e se ao culparmos os obesos, nos estejamos, na realidade, culpando as vítimas?
E se algumas das nossas noções fundamentais sobre obesidade estão, simplesmente, erradas?
Pessoalmente, eu não posso mais me dar ao luxo de ser arrogante ou de ter certeza de tudo. Eu tenho as minhas próprias idéias do que pode realmente estar no centro disso tudo, porém, eu estou totalmente aberto à outras.
Agora, a minha hipóteses, por que todo mundo sempre pergunta, é o seguinte:
Se você se perguntar do que que uma célula se protege quando ela se torna resistente à insulina, a resposta, provavelmente, não é: muita comida, mais sim: muita glicose, ou seja, açúcar no sangue.
Agora, nós sabemos que grãos refinados e carboidratos densos aumentam o açúcar no sangue e nós temos razões para acreditar que o açúcar leva diretamente à resistência à insulina.
Então, se você considera estes processos fisiológicos, minha hipótese é de que são estes grãos e carboidratos densos que estão alimentando esta epidemia de obesidade e diabetes. Porém, fazem isso através da resistência à insulina e não por comermos demais e pela falta de exercícios.
Agora, quando eu perdi meus 20kg alguns anos atrás, eu fiz isso simplesmente restringindo estas coisas específicas, o que significa, que eu sou suspeito de falar, baseando-se na minha experiência pessoal.
Mas isso não significa que eu estou errado e, mais importante ainda, tudo isso pode ser testado cientificamente.
Porém, o primeiro passo é aceitar a possibilidade de que os nossos conceitos atuais sobre obesidade, diabetes e resistência à insulina poderiam estar errados e por isso precisam ser testados.
Eu estou apostando a minha carreira nisso.
Hoje, eu devoto todo o meu tempo à este problema e vou aonde a ciência me levar.
Eu decidi que o que eu não posso e não vou mais fazer é fingir que eu tenho as respostas quando eu não as tenho. Eu ganhei bastante humildade por tudo aquilo que eu não sei.
Desde o ano passado, tenho tido muita sorte de trabalhar neste problema com o time de pesquisadores sobre obesidade e diabetes mais excepcional do país e a melhor parte é que, assim como, Abraham Lincoln se rodeou de um time de rivais, nós fizemos a mesma coisa.
Nós recrutamos um time de rivais científicos, os melhores e mais brilhantes, os quais, tem hipóteses diferentes sobre o que está no centro dessa epidemia. Alguns acham que são muitas calorias consumidas, outras acham que é muita gordura, outros acham que são muitos grãos refinados e carboidratos densos, etc.
Porém, este time multidiciplinar, altamente cético e extremamente talentoso, de pesquisadores, concordam em 2 coisas:
Primeiro, este problema é simplesmente muito importante para continuar sendo ignorado.
Segundo, se nós quisermos desafiar o conhecimento convencional, com os melhores experimentos que a ciência pode prover, nós podemos solucionar este problema.
Eu sei que é tentador querer ter uma resposta já, alguma forma de atitude ou política, alguma prescrição de dieta, coma isso e não aquilo, mas se nós quisermos definir isso de uma vez por todas, nós precisamos praticar muito mais ciência antes de nós escrevermos uma prescrição assim.
Para cuidar disso, o nosso programa de pesquisa está focado em 3 perguntas:
Como as diferentes comidas que consumimos afetam o nosso metabolismo, hormônios e enzimas e através de que processos moleculares?
Baseando-se nisso, as pessoas podem, de uma maneira segura e prática, implementar as mudanças necessárias?
E, finalmente, uma vez que nós identificarmos estas mudanças, como podemos mudar a convenção de comportamento para que isso se torne o novo padrão à ser seguido, ao invés, da exceção?
Você vê. Se você pensar nisso por um momento, simplesmente por que você sabe o que fazer, não significa que você sempre irá fazê-lo!
As vezes, nós precisamos facilitar pras pessoas e definir auxílio para as pessoas e isso pode ser estudado cientificamente.
Eu não sei como essa jornada irá acabar mas isso parece claro pra mim, no mínimo.
Nós não podemos continuar culpando nossos pacientes obesos e acima do peso como eu fiz.
A maioria deles, na realidade, querem fazer a coisa certa, mas, eles precisam saber o que é a coisa certa e isso precisa funcionar.
Eu sonho em um tempo onde nossos pacientes possam queimar o excesso de peso e se curarem da resistência à insulina por que os profissionais da saúde irão se livrar de suas barreiras mentais e resistência de ideais a ponto de voltar a ter coragem de jogar fora idéias velhas e terem mente aberta.
Seguir este caminho será melhor para os nossos pacientes e para a ciência.
Se a obesidade não for nada mais do que uma das consequência de uma doença metabólica, quão bem faz culparmos aqueles que sofrem da consequência?
As vezes, eu me lembro daquela noite na sala de emergência, 7 anos atrás. Eu gostaria de poder falar com aquela mulher novamente. Eu gostaria de dizer pra ela o quão arrependido eu estou.
Como médico, eu fiz o melhor trabalho possível, porém, como um ser humano, eu deixei a desejar.
Você não precisava do meu julgamento. Você precisava da minha empatia e compaixão.
Acima de tudo, você precisava de um médico que estivesse disposto à considerar que você não tivesse ignorado o sistema, mas sim, que o sistema, do qual eu era parte, tivesse ignorado você.
Se você está assistindo isso agora, eu espero que possa me perdoar.”
Compartilhe este artigo, compartilhe essas idéias. Este tipo de atitude fará com que cada vez mais médicos comecem a questionar o que estudaram e o que assumem ser o certo sobre o tratamento da diabetes e obesidade.
O mundo está morrendo cada vez mais por consequência destes problemas, algo está obviamente errado na maneira como lidamos com isso!
Espero que esta mensagem tenha sido útil à sua vida.
Um abraço,
A palestra original do Dr. Peter Attia, pode ser vista, em inglês, abaixo: